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Clipe de Rodrigo Campos reverbera, intuitivamente, rebaixamento da Vai-Vai

Ramiro Zwetsch

06/03/2019 09h36

Embora lançado hoje (06/03), o novo clipe de Rodrigo Campos já estava pronto há mais de dez dias. O músico apresentou a obra a este blog no último domingo (dia 3/3) e a data de upload registrada no youtube da primeira versão que assistimos é do dia 21 de fevereiro. A coincidência quis que seu lançamento fosse justamente no dia seguinte ao primeiro rebaixamento da história da Vai-Vai — uma das escolas de samba mais tradicionais de São Paulo, com sede no Bixiga, e a única a ostentar 15 títulos do carnaval.

As imagens que compõem o vídeo de "Chorei Comprido" (com captação, edição e direção de Guilherme Destro) são registradas na quadra da agremiação — e tanto a melancolia que transborda dos versos como o olhar de reverência que move a edição se comunicam intuitivamente com a tristeza gerada após o resultado de ontem. Critérios técnicos à parte (muito contestados nas redes sociais e também em um artigo publicado no UOL), é de se lamentar que justamente um enredo chamado "Quilombo do Futuro" e um desfile cheio de referências à história negra tenham sido castigados com a última colocação.

O depoimento de Rodrigo, também enviado ao blog antes da apuração, agora soa premonitório. "Fiz a música pensando no 'Mito de Sísifo', de Albert Camus, e onde foi contextualizada, nos ensaios da Vai-Vai, a letra, transfigurada em metalinguagem (por conta da associação com as imagens) ainda contém o mito: é como se o percurso de uma escola de samba fosse também, como o de Sísifo, o de empurrar a pedra montanha acima o ano todo, e deixá-la rolar montanha abaixo no fim do desfile, pra recomeçar em seguida", diz, referindo-se a um ensaio filosófico do escritor franco-argelino, de 1941. "É a condição humana, de novo, representada. A falta de sentido, inerente à vida, quando observada em arte, ou no processo artístico, pode nos encantar com a destreza do ser humano na invenção de sentido."

Pelas veias do compositor, corre o sangue do samba paulistano de mestres como Geraldo Filme — aquele dos famosos versos: "Quem Nunca Viu o Samba Amanhecer / Vai no Bixiga Pra Ver / Vai no Bixiga Pra Ver", um hino da Vai-Vai. De seus quatro discos lançados até aqui, dois deles — "São Mateus Não é Um Lugar Assim Tão Longe" (de 2009) e "Nove Sambas" (2018) — são explicitamente associados a esta tradição. O samba sempre continua.

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Sobre o autor

Ramiro Zwetsch é jornalista, DJ residente da festa Entrópica, sócio da Patuá Discos e criador do site Radiola Urbana. Foi editor-chefe dos programas "Manos e Minas" e "Metrópolis", repórter de música do Jornal da Tarde e colaborou para "Ilustrada", "Caderno 2", “Bravo!”, “Rolling Stone”, “Bizz”, “Carta Capital”, “Select” entre outros.

Sobre o blog

Divagações e reflexões sobre as maravilhas contemporâneas e pérolas negras da música Brasil adentro e mundo afora.

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